domingo, 30 de janeiro de 2011

O Sinal da Cruz

por Michel Pagiossi


“Caríssimos irmãos e irmãs em Cristo, hoje trazemos um artigo sobre a prática litúrgica do sinal-da-cruz, tanto dentro como fora da Santa Liturgia e da Santa Missa (ML)”
Neste artigo especial para a Gaudium Press, um de nossos colaboradores, Inácio Almeida, viaja entre os séculos, e aborda a importância do sinal da cruz, mostrando como diversas e importantes figuras históricas se valiam do sinal, o dístico do cristão, em momentos de perigo, de decisão e na iminência da morte, como forma de alcançar a serenidade necessária em momentos cruciais.
Outrora, em Besra na Idumea, ocupava o trono Episcopal São Julião. Este santo tinha uma alma cheia de zelo e piedade, não media esforços para trazer ao redil de Nosso Senhor Jesus Cristo as ovelhas tresmalhadas daquele rebanho.
Entretanto, alguns influentes habitantes desta cidade, descontentes com o progresso da fé, tomaram a resolução de envenenar este santo homem de Deus. Para isto, subornaram o próprio criado do Bispo. O infeliz aceitou e recebeu deles a bebida envenenada. Divinamente de tudo avisado, o Santo diz ao criado:
"-Vai, e da minha parte, convida para o meu jantar de hoje os principais habitantes da cidade".
São Julião bem sabia que entre eles estariam os culpados. Todos acedem ao convite. Num dado momento, o Santo Bispo sem acusar ninguém, lhes diz com doçura evangélica:
"-Visto quererem envenenar o humilde Julião, eis que diante de vós passo a beber o veneno".
Fez então três vezes o Sinal da Cruz sobre a taça, dizendo: "Eu te bebo em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo".
Em seguida, bebeu o veneno até a última gota e, ó milagre Divino, São Julião não sentiu o menor mal. Seus inimigos, diante de tal prodígio, caíram de joelhos a seus pés e lhe pediram perdão.
De onde vem a força deste simples gesto? Qual a sua origem? Em que momentos devemos fazê-lo?
Este Sinal Divino, sempre foi considerado como um mestre sábio e conciso, pois resume em si, de modo simples e didático, os dois principais mistérios de nossa fé que são a Unidade e Trindade de Deus e a Encarnação, Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Entretanto, nos dias de hoje, poucos são os que conhecem tudo o que contém, tudo o que ensina, tudo o que opera de sublime, de santo e de divino, e em conseqüência, de soberanamente proveitoso às almas, esta fórmula tão antiga como a Igreja. Os primeiros cristãos faziam o Sinal da Cruz a cada instante. Assim afirma São Basílio: "Para os que põem sua esperança em Jesus Cristo, fazer o Sinal da Cruz é a primeira e mais conhecida coisa que entre nós se pratica".
Vejamos o exemplo de Santa Tecla, ilustre por nascimento, mais ainda ilustre pela fé:
"Agarrada pelos algozes, é conduzida à fogueira, faz o Sinal da Cruz, entra nela a passo firme e fica tranqüila no meio das chamas".
Imediatamente cai do céu uma torrente de água, e o fogo é apagado. E a jovem heroína sai da fogueira sem ter queimado um só fio de cabelo. À maneira desta mártir que ao caminhar para o último suplício não deixava de se fortalecer pelo Sinal da Cruz, os verdadeiros Cristãos dos séculos passados recorriam sempre a este sinal consolador para suavizar suas dores e santificar sua morte.
Façamos um rápido passeio pelos séculos e paremos um instante em Aix la Chapelle para assistir à morte do grande imperador:
"... No dia seguinte, logo ao amanhecer, Carlos Magno estando bem consciente do que devia fazer, estendeu a mão direita e enquanto pôde, fez o Sinal da Cruz na fronte, no peito e no restante do corpo."
Voemos à bela França do século XIII para darmos a palavra ao Príncipe de Joinville, biógrafo e amigo de São Luís IX:
"-À mesa, no conselho, no combate, em todas as suas ações, o rei começava sempre pelo Sinal da Cruz".
Agora estamos diante de Bayard, o cavaleiro sem medo e sem mácula. Vemo-lo ferido de morte, deitado à sombra de um grande carvalho fazendo o seu último gesto que foi um grande Sinal da Cruz feito com sua própria espada.
Em 1571, D. João D'Áustria, antes de dar o sinal de ataque na Batalha de Lepanto em que se decidia o futuro da cristandade, fez um grande e lento Sinal da Cruz repetido por todos os seus capitães e a vitória logo se fez esperar. Por estes e outros exemplos, vemos quão poderosa oração é o Sinal da Cruz. De quantas graças nos enriquece ele, e de quantos perigos preserva nossa frágil existência.

Quando devemos fazer o Sinal da Cruz
Mas... Quando devemos fazer o Sinal da Cruz? Tertuliano nos responde:
"A cada movimento e a cada passo, ao entrar e ao sair de casa, ao acender as luzes, estando para comer, ao deitar e ao levantar, qualquer que seja o ato que pratiquemos ou o lugar para onde vamos, sempre marcamos nossa fronte com o Sinal da Cruz."
E de todas as práticas litúrgicas, o Sinal da Cruz é a principal, a mais comum, a mais familiar. É a alma das orações e das bênçãos. A Santa Igreja em suas cerimônias, em nenhuma delas deixa de empregá-lo. Começa, continua, e tudo termina por este sinal. Ao destinar para o seu próprio uso a água, o cálice, o altar e também aquilo que pertence aos seus filhos como as habitações, os campos, os rebanhos. De tudo toma posse pelo Sinal da Cruz.
A primeira coisa que faz sobre o corpo da criança ao sair do seio materno, e a última, quando já na ancianidade, o entrega às entranhas da Terra, é ainda este Divino Sinal. O que dizer da Santa Missa que é a ação por excelência? A Esposa de Cristo mais do que nunca o multiplica... O sacerdote, no decurso da celebração, ao abrir os braços imitando o Divino crucificado, não é o seu corpo o próprio Sinal da Cruz vivo? Também diante das tentações, nós devemos fazer uso deste sinal libertador. Ouçamos o que nos diz Orígenes:
"É tal a força do Sinal da Cruz, que se o colocardes diante dos olhos e o guardares no coração, não haverá concupiscência, voluptuosidade ou furor que possa resistir-lhe. À vista dele desaparece todo o pecado."
E ao findar o dia, se a fadiga e os fracassos da jornada levarem a vossa alma para o desânimo ou até o desespero. Ouçamos o que nos aconselha o sábio Prudêncio: "Quando ao convite do sono, deitares em teu casto leito, fazeis o Sinal da Cruz sobre a fronte e sobre o coração, a cruz te preservará de todo o pecado. Santificada por este Sinal, a tua alma não vacilará".
Mas para alcançarmos tão preciosos benefícios, é mister que façamos o Sinal da Cruz bem feito e com firmeza. A devoção, a confiança, o respeito e a regularidade devem acompanhar o movimento de nossa mão.
Meditando nas palavras pronunciadas, devemos pensar em Deus Padre, Deus Filho e no Espírito Santo. Além disto, tocando com a mão direita no centro da testa, devemos ter a intenção de consagrar ao Senhor a nossa inteligência, os nossos pensamentos; tocando o peito, consagrar-lhe o nosso coração, os nossos afetos e tocando os ombros, todas as nossas obras.
Porém não permitamos que o respeito humano nos impeça de manifestar pública e abertamente o Sinal da Cruz, pois se hoje uma grande parcela de nossa sociedade está afundada na impiedade e no materialismo, a necessidade que temos de fazer uso deste augusto Sinal é cada vez maior. Este estandarte divino que salvou o mundo é dotado de força para salvá-lo ainda. E, fazendo eco as palavras dos padres e doutores da igreja, concluímos:
Salve ó Sinal da Cruz! Estandarte do grande Rei, troféu imortal do Senhor, Sinal de vida, salvação e benção. És nossa poderosa guarda que em vista dos pobres é de graça e por causa dos fracos não exige esforço. És a tácita evocação de Jesus crucificado, monumento da vitória do Divino Redentor. Teus efeitos são largos como o universo, duradouros como os séculos. Tua eloquência dissipa as trevas, aclara os caminhos. És a honra da fronte, a glória dos mártires, a esperança dos cristãos. És enfim, o fundamento da Igreja.
Principais fontes: O Sinal da Cruz de Monsenhor Gaume; Catecismo da Igreja Católica; e o Dicionário de Liturgia.

Por Inácio Almeida











domingo, 23 de janeiro de 2011

A beleza salvará o mundo


“Caríssimos irmãos e irmãs em Cristo, continuamos a falar sobre a Beleza e sua necessidade no mundo (como bem coloca o texto) e de forma bastante clara na Santa Igreja, especialmente na Santa Liturgia e na Santa Missa (ML)”

Contrariamente aos meus costumes, fui obrigado pelas circunstâncias a ir ao shopping, no domingo, para fazer umas poucas compras - caindo assim numa imperdoável concessão ao consumismo. E esse tempo que não pude dedicar ao descanso dominical, como nos recomendam os sábios preceitos da Igreja, serviu-me para tomar contato com determinada realidade, na qual nem sempre prestamos atenção. Talvez minhas observações coincidam com as do simpático e perspicaz leitor. Cada um dirá...
Ao entrar no imenso edifício, onde uma brisa fresca me aliviou dos ardores de um causticante sol, procurei logo com decisão a loja onde pensava encontrar os artigos que me faziam falta.
Na primeira não encontrei o que desejava. Na segunda estava tudo muito caro. Por fim achei o que queria. Mas tanto tinha andado dentro do shopping que ao sair da loja já não sabia situar-me naquele imenso edifício, onde uma multidão perambulava vagarosamente de um lado para o outro.
Ao tentar localizar-me, fui obrigado a parar, por uns instantes, e a prestar atenção no público que lotava aquelas galerias. Tive a impressão de que estavam como eu: sem rumo. Todos caminhavam sem pressa, vagarosamente, quase arrastando os pés... Uns paravam diante das vitrines, olhavam sem muita atenção, prosseguiam seu lento passeio. Poucos entravam para fazer alguma compra. Talvez por não terem dinheiro, talvez por não saberem bem o que queriam...
E pensei com os meus botões: "Como a atitude dessas pessoas reflete bem a situação geral do mundo! Caminham sem rumo, não sabem bem o que querem, nem têm finalidade na vida... Afastaram-se de Deus, e a Igreja já não é o farol da sua existência. Que tristeza!"
De volta para casa, folheando um livro de um conhecido autor católico francês do início do século XX, caiu-me sob os olhos um trecho que parecia iluminar meu pensamento. Tratava sobre o papel da arte no apostolado. Parecia até que Huysmans tinha previsto o que anos mais tarde o Concílio Vaticano II e o próprio Papa João Paulo II ressaltariam, com tanto acerto, sobre o papel da cultura na evangelização.
Vou traduzi-lo aqui, caro leitor, para que juntos o possamos saborear, tão interessante ele é:

[Na Igreja,] todas as obras confluem para Deus, exceto a da arte. As congregações repartiram entre si todas as outras, salvo aquela. Algumas, efetivamente, como os jesuítas, os franciscanos, os redentoristas, os dominicanos, os missionários, pregam, organizam retiros, evangelizam os infiéis; outras mantêm pensionatos e escolas; outras, como os sulpicianos e os lazaristas, seminários; a maioria delas inclusive desempenha essas diferentes funções; outras, ainda, cuidam de doentes, ou, como os cartuxos e os cistercienses, reparam os pecados do mundo, são reservatórios de expiação e de penitência; outras, enfim, como os beneditinos da Congregação da França, se consagram mais especialmente ao serviço litúrgico, ao ofício divino dos louvores.
Mas nenhuma, nem mesmo a dos beneditinos aos quais ele pertence de direito, tem reinvidicado os direitos sobre a arte religiosa, que ficou sem herdeiros desde o desaparecimento de Cluny ....
Além disso, é preciso ser bem ignorante para negar, mesmo apenas do ponto de vista prático, o poder da arte. Ela foi a auxiliar mais segura da mística e da liturgia, durante a Idade Média; foi a filha amada da Igreja, sua intérprete, que ela encarregava de exprimir seus pensamentos, de expô-los nos livros, sobre os pórticos das catedrais, nos retábulos, na arquitetonia dos edifícios.
Era ela que comentava os Evangelhos e abrasava as multidões; que as lançava, sorrindo em alegres orações, ao pé dos presépios, ou as sacudia com soluços diante dos conjuntos lacrimosos dos calvários; que as fazia ajoelhar, estremecidas, quando em maravilhosas Páscoas, Jesus, ressuscitado, sorria, apoiado sobre sua enxada, para Madalena,ou que as erguia, ofegantes, gritando de alegria, quando, em extraordinárias Ascensões, Cristo, subindo para um céu dourado, levantava sua mão perfurada, de onde corriam rubis, para as abençoar!
Tudo isso está distante, infelizmente! Em que estado de abandono e de anemia se encontra a Igreja, depois que Ela desinteressou-se da arte, e que a arte retirou-se dEla! Ela perdeu seu melhor modo de propaganda, seu mais seguro meio de defesa.
Pareceria que agora, quando é assaltada e faz água de todos os lados, Ela deve suplicar ao Senhor que lhe envie artistas... (J. K. Huysmans, L'Oblat, Stock Éditeur, 8ª ed., 1903, pp. 348 a 350).

O Papa João Paulo II tem extraordinária sensibilidade para o papel da arte na evangelização. Por isso, na sua Carta aos Artistas, referiu-se aos problemas de nossa época dizendo: "a beleza salvará o mundo".
Da consideração admirativa dos esplendores da arte católica, nasce para os Arautos do Evangelho um ideal: fazer surgir de entre as luzes matizadas e sublimes dos vitrais medievais uma aurora de novo brilho e fulgor dentro da Santa Igreja.
Levar o belo a pobres e ricos, a todos os carentes do maravilhoso, é a alta missão evangelizadora decorrente deste novo Carisma,  reconhecido pelo Papa João Paulo II.

(Revista Arautos do Evangelho, Janeiro/2002, n. 1, p. 26-27)

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

COMPÊNDIO DE TERMOS LITÚRGICOS


                    Liturgia
1. Nome e conceito. (Do gr. = serviço do povo). No antigo uso profano designava qualquer serviço em favor do povo. No séc. II a.C. (nomeadamente na tradução dos Setenta) aparece também como serviço do culto. Mais tarde, nas Igrejas Orientais passou a designar a Missa. Na Igreja latina, só aparece no séc. XVI. O seu sentido foi-se precisando com o “Movimento Litúrgico”. Depois de Pio XII (Enc. Mediator Dei, 1947), o Conc. Vat. II ( Sacrosanctum Concilium 7), para a definir, evoca três notas essenciais: é o exercício do sacerdócio de Cristo; nela, sinais sensíveis significam e, a seu modo, realizam a santificação do homem; e assim o Corpo Místico de Cristo (a Cabeça e os membros) exerce o culto público integral. O sacerdócio de Cristo exerce-se nos dois sentidos: no de culto perfeito a Deus (sentido ascendente) e no de santificação dos homens (sentido descendente). Neste exercício, a presença e atuação de Jesus Cristo são eficazmente asseguradas por sinais sacramentais. A própria Igreja é sacramento de Cristo, pois é através dela que, hoje, Jesus fala aos fiéis, lhes perdoa os pecados e os santifica, associando-os intimamente à sua oração e ao seu sacrifício de valor infinito (mistério pascal). Com razão se diz que a liturgia é «o cume para que tende toda a atividade da Igreja e simultaneamente a fonte de onde dimana toda a sua força» ( Sacrosanctum Concilium 10).

2. A liturgia ao longo da história. No NT, há referências a acções litúrgicas (1Cor 11,1-33; Act I2,42-47...). Nas Apologias de S. Justino (séc. II), na Tradição Apostólica de Hipólito (séc. III) e noutros escritos dos primeiros séculos já se descrevem as várias celebrações (missa, sacramentos…). Com a paz de Constantino (séc. IV), a Igreja organiza-se e o culto litúrgico estabiliza-se, adquirindo grande esplendor. Para isso contribuíram grandes papas e bispos (Gregório Magno, Ambrósio, Cirilo…). São deste tempo os “sacramentários”, que fixam os textos litúrgicos. É um tempo criador, durante o qual se desenvolvem, a par, as liturgias orientais e as latinas (romana, ambrosiana…). Segue-se um período, até ao séc. XII, de certa confusão pela influência das Igrejas germânicas, francas e célticas. O povo tende a afastar-se da liturgia para se dar às devoções. No séc. XIII, os monges de Cluny e as Ordens Mendicantes, na sua acção missionária, contribuem para impor a todo o Ocidente a liturgia romana. São desta época o pontifical, o missal, o breviário e o ritual. Os dois últimos séculos, anteriores ao Conc. de Trento (séc. XVI), pouco significaram para a liturgia. Este Conc. e os Papas que o executaram puseram cobro aos abusos, estabeleceram os fundamentos teológicos das acções litúrgicas e, no clima da Contra-Reforma perante o Protestantismo, uniformizaram rigidamente a liturgia, centralizando toda a legislação na Cúria Romana. Pio V publicou o Breviário (1568) e o Missal (1570), e, outros Papas, os restantes livros litúrgicos, que estiveram em uso praticamente até ao Conc. Vat. II. Salvas a ortodoxia e a disciplina, perdeu-se o influxo vital da liturgia. O Movimento Litúrgico reagiu e preparou a reforma da liturgia, a qual, depois das intervenções de S. Pio X e de Pio XII, foi assumida pelo Conc. Vat. II, orientada pela Const. Sacrosanctum Concilium. Paulo VI, o grande executor do Concílio, empenhou-se a fundo nesta reforma, que hoje está praticamente concluída, embora nem sempre aplicada. Teve em vista principalmente a «participação consciente, activa e frutuosa» nas acções litúrgicas (Sacrosanctum Concilium 11). Para isso, se clarificaram os ritos, se generalizou o uso das línguas vernáculas e se admitiu uma certa margem de adaptação nas formas de celebrar.

3. Movimento Litúrgico. Assim se ficou a chamar o conjunto dos esforços tendentes a tornar a liturgia mais vivida pelo povo de Deus. Preparado pelo estudo das fontes litúrgicas por especialistas dos sécs. XVII-XVIII, foi seu grande impulsionador D. Guéranger (+1875) com os seus monges beneditinos do Mosteiro de Solesmes. Na primeira fase, o M. L. germinou nos grandes mosteiros (Maredsous, Mont-César, Maria-Lach...). Depois, com D. Lambert Beaudouin (+1960), passou às paróquias e irradiou nomeadamente através de congressos e de revistas de pastoral litúrgica (Questions Liturgiques et Paroissiales, Maison Dieu). S. Pio X oficializou o M. L. e promoveu o canto gregoriano, a participação dos fiéis na Missa e a comunhão frequente, mesmo das crianças. Pio XII foi outro grande paladino deste movimento, dele ficando célebre a sua Enc. Mediator Dei (1947).

4. Em Portugal, o M. L. deu os primeiros sinais nos Congressos Litúrgicos de Vila Real (1926), Braga (1928), Lisboa (1932) e Porto/Santo Tirso (1932). Entre os seus mentores e promotores, é de justiça referir D. António Coelho e Mons. Pereira dos Reis, respectivamente, nos dois principais centros de irradiação, o Mosteiro de Singeverga e o Seminário dos Olivais, com as revistas Opus Dei, Mensageiro de S. Bento, Ora et Labora e Novellae Olivarum. Mons. Freitas Barros promoveu, desde 1927, edições diversas da tradução portuguesa do Missal. Durante o Conc. foi constituída a Comissão Episcopal da Liturgia que, assessorada pelo respectivo Secretariado Nacional, assegurou as traduções e edições dos novos livros litúrgicos e a formação litúrgica do clero e dos fiéis, nomeadamente pela realização todos os anos, em Fátima, de Encontros Nacionais de Pastoral Litúrgica. 

5. Elementos estruturais da liturgia. A liturgia concretiza-se nas celebrações litúrgicas (missa e sacramentos, Ofício Divino, bênçãos e outros sacramentais). A estrutura de cada uma das celebrações foi-se definindo desde os primórdios da Igreja. Esquematicamente, nas celebrações, enquadradas pelos ritos de abertura e de conclusão, desenrolam-se os vários ritos, em geral em torno do essencial. Os ritos são ilustrados pela Palavra de Deus, que é proclamada, rezada, cantada e inspira os diversos textos litúrgicos não bíblicos. Em geral, as celebrações contêm uma primeira parte de liturgia da palavra, que a reforma litúrgica pôs em evidência (Sacrosanctum Concilium 35). Os textos devem ser proferidos de acordo com a sua natureza, pois uma coisa é aclamar, outra suplicar ou meditar, ler ao povo ou cantar em conjunto (CB 116; EDREL 2653). As celebrações litúrgicas são de toda a Igreja, representada em cada uma pela assembleia celebrante, mesmo quando, nos sacramentos e sacramentais, são especialmente beneficiados com a graça de Deus determinados fiéis. A assembleia é um corpo orgânico, como o é a Igreja. Na maioria das celebrações, há um presidente que, pela ordenação sacerdotal, faz as vezes de Jesus Cabeça do Corpo Místico e atua em seu nome. Para determinadas outras funções, podem ser requeridos outros ministros (diácono, leitores e acólitos instituídos, leigos). E há celebrações que podem ser presididas por simples leigos. Os livros litúrgicos contêm não só os textos que pertencem aos diversos agentes litúrgicos, mas ainda as regras (rubricas) que os ritos devem respeitar. Tais ritos, que, segundo a reforma litúrgica, devem ser simples e claros (SC 34), recorrem a elementos naturais, (água, vinho, óleo, fogo, incenso…); a gestos (andar, comer, beber, lavar…); a posições corporais (de pé, sentados, de joelhos); e ainda a uma série de objectos, as alfaias litúrgicas (cálice, patena, lâmpadas, toalhas, paramentos…) e adequado local (igreja ou outro lugar de culto, como altar, ambão, crucifixo, imagens, bancos…). A celebração da liturgia decorre, no tempo, de acordo com o calendário do ano litúrgico. Nele se definem, ritmadas pela celebração da Páscoa semanal, as diversas solenidades, festas e memórias, em hora do Senhor, de Maria e dos Santos.

(Dom Manoel Franco Falcão)

A palavra liturgia provém do grego clássico "leitourghia" e deriva da composição de laós (povo) e de ergon (obra). Quer dizer a união de um povo, expressão de comunidade, que se reune para viver de forma profunda e solene uma obra de adoração completa ao seu Deus publicamente e expressivamente. É na sagrada liturgia e através dela que vivenciamos da maneira mais elevada a nossa fé a Deus, verticalmente, e o nosso amor e comunhão com o irmão que também vem para louvar e agradecer ao mesmo Deus, horizontalmente. A Liturgia Católica é dessa forma a oração mais sagrada da Igreja porque resulta da união de uma comunidade que unida busca contemplar e encontrar o insondável mistério do amor de Deus pela humanidade, com sinais, símbolos e gestos. Como diz Frei Patrício Sciadini, a liturgia é o momento aonde "sentimento, fé e arte se mesclam com a sabedoria da mente e do coração, formando o mundo espiritual dos gestos e do sagrado".

Para apreciarmos uma obra de arte precisamos ter alguns conhecimentos básicos para não "coçarmos a cabeça" diante dela. Conhecer o mínimo sobre aquela escola artística, sobre o autor e sobre as suas intenções é pré-requisito para compreender a mensagem contida em cada peça artística, isso porque o ser humano só consegue aprecisar e contemplar aquilo que conhece e entende. Infelizmente muitos de nós católicos passamos anos e anos participando da missa dominical sem entender o sentido da liturgia e acabamos nos limitando a imitar o que o outro faz, esvaziando assim toda a profundidade e toda a vida da sagrada missa. Não é a toa que muitos fiéis também "coçam a cabeça" diante dos símbolos, dos gestos e sinais presentes na liturgia justamente porque não conhecem o que tudo aquilo diz. Essas mesmas pessoas acabam a ler por ler, a se portar de forma maquinal e a celebrar para cumprir a obrigação. Mas aqueles que buscam compreender plenamente o sentido da liturgia recebem os frutos do Espírito Santo, inspirador da liturgia, e conseguem dia após dia através da participação viva da missa uma espiritualidade cada vez mais elevada e um fortalecimento de todas as virtudes cristãs.

Não é a toa que o Concílio Vaticano II chama a sagrada liturgia de o "cume para qual tende a ação da Igreja e, ao mesmo tempo, é a fonte donde emana toda a sua força". Mediante esses sinais sensíveis presentes na sagrada liturgia chegamos a contemplar com toda a riqueza e plenitude os mistérios do amor de Deus pela nossa humanidade. Vamos então procurar compreender tudo o que essa mesma liturgia nos oferece para chegarmos com maior rapidez e eficácia espiritual a esse cume, a essas alturas sagradas para onde nosso coração e nossa alma buscam sem cessar: a própria essência de Deus.

"Fica sabendo, ó cristão, que mais merece ouvir devotamente uma só missa do que distribuir todas as riquezas aos pobres e peregrinar toda terra". (São Bernardo Bernardo de Claraval)
Autor: Silvio L. Medeiros

Citações dos Santos:
- "Deves ter veneração e respeito pela Santa Liturgia da Igreja e por cada uma das suas cerimônias. - Cumpre-as fielmente. - Não vês que nós, os pobrezinhos dos homens, necessitamos que até as coisas mais nobres e grandes entrem pelos sentidos?" (S. JoseMaría Escrivá - Caminho 522)
- "A Igreja canta - disse alguém - porque falar não seria bastante para a sua oração. - Tu, cristão - e cristão escolhido -, deves aprender a cantar liturgicamente." (S. JoseMaría Escrivá - Caminho 523)
- "Aquela mulher que, em casa de Simão o leproso, em Betânia, unge com rico perfume a cabeça do Mestre, recorda-nos o dever de sermos magnânimos no culto de Deus. - Todo o luxo, majestade e beleza me parecem pouco." (S. JoseMaría Escrivá - Caminho 527)

                  Missa

O termo Missa, derivado do lat. "missio", com sentido de despedida e de envio, designa a *celebração do *sacramento da *Eucaristia (ou *mis­-tério pascal) sobretudo na dimensão sa­crificial. Ini­cial­mente usaram-se outros termos, como “fracção do pão” (Act 2, 42; 20,7), “ceia do Senhor” (1Cor 11, 20), “acção”, “oblação”, “sacrifício” ou “sacrifício eucarístico”.

2. Instituição e natureza. Antes de oferecer a vida como sinal do maior amor no sacrifício da Cruz, reparando os pecados do mun­do e dando plena glória a Deus, J. C. dei­xou-nos a maneira mais viva de nos associarmos ao seu gesto sacrificial úni­co e de valor infinito. Para isso, na Últi­ma Ceia, instituiu com a força de *sa­cra­mento o sacrifício eucarístico e o sa­cerdócio ministerial, dando aos Apóstolos o poder e a ordem de repetirem em sua memória os gestos e as palavras de consagração do pão e do vinho no seu Corpo e Sangue, hoje no estado glorio­so. Assim, os fiéis, em qualquer parte do mundo e ao longo dos séculos, passa­ram a ter a possibilidade de: 1) pelo sinal sacramental da consagração em separado do pão e do vinho, se associarem ao sacrifício de J. C. na Cruz; 2) de se unirem da manei­ra mais perfeita e expressiva, pela comu­nhão sacramental, a J. C. entregue em sacrifício agradável ao Pai; 3) de terem o próprio J. C. presen­te sacra­men­tal­mente no sacrário como amigo e como alimento da vida da graça.

3. A celebração eucarística. A expressão ri­tual e sacramental da acção sagrada (Missa), em parte inspirada nas práticas judaicas da sinagoga e da ceia pascal, já aparece nos primeiros tempos da Igreja com o esquema actual (p.ex., na 1.ª Apologia de S. Justino, séc. II; cf. Cat. 1345). A celebração da M., depois da purificação de alguns acrescentos devocionais feita pela reforma do Conc. Vat. II, decorre segundo o seguinte esquema: 1) Ritos iniciais: entrada do ce­le­brante, saudação, acto penitencial (segundo diversas modalidades: confissão, Kyrie e absolvição, ou em alternativa o *asperges), Glória (nos dias mais sole­nes) e oração colecta. 2) Liturgia da Pa­lavra: leituras bíblicas, cânticos intercalares, homilia, credo ou profissão de fé (aos domingos e solenidades), e ora­ção universal ou dos fiéis. 3) Liturgia eucarística, que repete sacramental­men­te os gestos e palavras de J. C. na Ceia: a) preparação das oferendas (pão e vinho) e do altar; b) oração eucarística (também chamada *cânone ou *anáfo­ra) contendo os seguintes elementos: pre­-­fácio ou acção de graças terminando com a aclamação do Sanctus; *epiclese ou invocação do Espírito Santo para que as oferendas se convertam no Corpo e Sangue do Senhor; narração da institui­ção operando a consagração; *ana­m­nese ou memorial da paixão, morte e ressurreição de J. C.; oblação ao Pai de J. C. hóstia e com Jesus oferente; intercessões dos Santos e memórias (*mementos) dos vivos e dos defuntos; ­ter­mi­nando com a doxologia final, ratificada pelo *Ámen do povo; e c) rito da comu­nhão, preparado pela oração do­mi­nical (Pai-Nosso); gesto da paz, frac­ção do pão e inclusão de uma partícula no vinho consagrado (enquanto se canta ou recita o Agnus Dei); preparação pessoal para a comunhão; comunhão do(s) sa­cer­dote(s), dos outros ministros e dos fiéis; tempo de recolhimento; e oração depois da comunhão. 4) Ritos de con­clu­são: saudação, bênção (a que, em cer­­tos dias, se pode acrescentar uma “ora­ção sobre o povo”); e despedida. V. Missal, IGMR; cf. Cat. 1345-1355.

4. Particularidades. Na M., o sacerdote (bispo ou presbítero) que preside fá-lo em nome de J. C. e também da Igreja pre­sente na assembleia celebrante. Além do presidente, é bom que parti­ci­pem activamente outros *ministros ou ministrantes (sacerdotes concelebran­tes, diácono, acólitos, leitores, canto­res...) e os fiéis da assembleia, pelos ges­tos, atitudes, diálogos, aclamações, canto, orações… A M. mais importante, chamada “estacional” (antigamente “pon­tifical”), é a do bispo da diocese ro­deado do seu presbitério e do povo, nas principais festas do ano litúrgico, celebrada normalmente na catedral (CB 119ss; SC 41). É também particularmente importante, para cada comuni­dade paroquial a M. dos domingos, dias de preceito e outras festividades, a que é costume chamar “paroquial” ou “conventual”. É da estrutura da M. o uso do canto pelo celebrante e pela assembleia. Por isso, pelo menos as missas mais importantes devem ser “cantadas” ou “so­lenes” (como se dizia no passado, em con­traste com as missas “rezadas”, sem canto). A pedagogia do sagrado justifica que os celebrantes estejam revestidos dos paramentos próprios e o altar de­vi­damente preparado. Para favorecer a participação dos fiéis, a M. passou a ser celebrada em vernáculo (a menos que, para assembleias inter­na­cio­nais, convenha o clássico latim, que favorece a unidade na universalidade). Para facilitar a comunhão sacramental, o *je­jum eucarístico foi reduzido a uma hora, ou mesmo a menos, nalguns casos espe­ciais (doentes, sacerdotes que binam ou trinam…). V. Eucaristia.

5. Missas para grupos particulares. A Igre­ja procura que os fiéis se insiram na comunidade eclesial (diocese, paróquia), nomeadamente nas celebrações litúrgicas dos do­mingos e dias festivos. No entanto, a solicitude pastoral tem em atenção grupos particulares de fiéis, para os quais a Eucaristia é meio de aprofundamento da vida cristã, desde que se não alimen­te o espírito de separação. Destes grupos fazem parte os que se reúnem em acções de formação e apostolado, os que vivem longe dos lugares habituais de missa, e os grupos familiares com doentes ou reunidos por especial cir­cuns­tância religiosa (velar defunto, ce­le­brar bodas de prata matrimoniais, etc.). A M. deve celebrar-se em lugar sagrado, mas o bispo pode autorizar que seja noutro lugar decente, mesmo em sala de casa particular, mas não em quar­to de dormir. Em tudo se devem res­peitar as normas litúrgicas da cele­bra­ção e promover a melhor participa­ção da assembleia celebrante. (Cf. Instr. da SCCD Actio pastoralis de 15.5.1969, EDREL 2671-2685).

6. Nomenclatura popular. No uso corrente, diz-se “Missa do Galo” a da meia-noite de Natal; “Mis­sa de Requiem”, “de Finados”, “de Defuntos” ou “das Almas”, a que se ce­le­bra em sufrágio de fiéis defuntos; “Missa Nova”, a que o neo-sacerdote celebra depois daquela em que foi orde­nado; “Missa negra”, o rito sacrílego de índole mágica ou satânica, à imitação duma missa, por vezes profanando ­ignobilmente hóstias consagradas rou­badas.

                  Missal

1. Breve história. Considerado o mais importante livro litúrgico, o m. contém as orações e outras fórmulas que pertencem ao sacerdote celebrante da *Missa. Actualmente está em vigor a 3.ª edição típica (Abr. 2000) do Missal Romano, saído da reforma do Conc. Vat. II (1.ª ed. 1970 e 2.ª ed. 1975), ela­bo­rada a partir do Missal de S. Pio V (1570) mandado editar pelo Conc. de Trento, purificado de acrescentos vá­rios. Inicialmente a Bíblia era o único livro usado na celebração da Missa, dei­xando-se ao sacerdote celebrante impro­visar as orações. Pouco a pouco fo­ram aparecendo colecções de textos escritos para o celebrante, a que cha­ma­vam “sacramentários”. Na clerical Ida­de Média, por comodidade e presunção de que ao sacerdote celebrante competiam todos os textos da missa, surgiram os “missais plenários”, que incluíam as leituras e cânticos. Com o Conc. Vat. II voltou a dar-se importância à distribuição das diversas funções da Missa pelos vários ministros e outros agentes litúrgicos, o que levou à separação dos livros: missal, leccionários, evangeliário e livros dos cânticos (gra­duais…).

2. O atual Missal Romano abre com a “Ins­tru­ção Geral do Missal Romano” (IGMR), verdadeiro directó­rio da celebração (mais do que simples repositório de rubricas rituais), e com as “Normas Gerais do Ano Litúrgico e do Calendário”. No centro encontra-se o “Ordinário da Missa”, parte comum, embora com variantes opcionais de certas fórmulas. Envolvendo o Ordinário, encontram-se os textos próprios das missas dos *domingos, *férias, *soleni­dades, *festas e *memórias obrigatórias e facultativas, missas rituais e votivas e outros textos complementares ou de opção. São suas partes: Próprio do Tem­po (ou Temporal), Ordinário da Missa, Próprio dos Santos (ou Santoral), Co­muns, Missas Rituais, Missas e Orações ad diversa, Missas Votivas, Missas de Defuntos (e Apêndice).

3. Missais pró­prios estão previstos para os diversos ritos, alguns dos quais latinos, como o “Bracarense”.

4. Missais dos fiéis. Estes Missais, em vernáculo, surgiram com o *mo­vimento litúrgico, tendo sido de grande utilidade quando a celebração se fazia em latim, e ainda o são para pre­parar e aprofundar a participação dos fiéis nas missas.

                  Rito

1. Em geral. São actos executados de forma precisa por um grupo humano que lhes dá sentido. Podem ser: r. sociais (no convívio corrente ou em ce­ri­mónias protocolares); ou r. sagrados (mágicos ou religiosos). De entre es­tes últimos, interessam aqui os r. da religião católica (litúrgicos e da piedade popular).

2. Ritos litúrgicos. Esta ex­pres­são pode ter dois sentidos: a) Ritos das di­ver­sas Igrejas Católicas, que se podem agrupar em: ritos latinos (tendo por ba­se o rito romano e admitindo as varian­tes dos ritos ambrosiano, hispânico e ou­tros, como o bracarense); e ritos orien­tais (especialmente o bizantino quer em língua grega quer em esla­va). O Conc. Vat. II, na Const. *Sacro­sanc­tum Con­cilium, considera iguais em direito e honra todos os r. legitimamente reco­nhecidos (SC 4). A reforma litúrgica determinada por esta Const. aplica-se, nos seus princípios gerais, a todos os r., mas as normas práticas refe­rem-se ao rito romano (SC.3); b) Ritos das celebra­ções litúrgicas. Estes r. encontram-se descritos nas *rubricas dos livros litúrgicos (Missal, Pontifical, Rituais…). A revisão destes livros, segundo as directivas do Concílio, en­con­tra-se já feita, quer nas edições típicas (na língua oficial latina), quer nas traduções em línguas verná­culas devidamente aprovadas pelas Conferências Episcopais e reco­nhecidas pela Santa Sé. As celebrações litúrgicas (da missa, de sacramentos, de sacramentais…) compõe-se de r. diversos, cada um deles com a sua história e significado espiritual. Nos r. há atitudes, gestos ou uso de coisas, e há as palavras do presidente, ministros e assembleia que lhes dão sentido. São exemplos de ritos: o abençoar e o benzer-se, o genuflectir diante do SS. Sacramento ou a inclinação diante do presidente em fun­ções, os cortejos da entrada, do ofertó­rio, da comunhão (na missa), os ritos essenciais dos sacramentos com a ma­téria e a forma, etc. É missão da pastoral litúrgica levar todos os que tomam parte nas celebrações a executarem de forma correcta, cons­ciente e proveitosa todos os r.

3. Ritos da piedade popular. São muitos estes r., chegados até nós por uma tra­di­ção po­pu­lar fortemente iluminada pela fé cris­tã. O Directório da Pie­dade Popular e Liturgia recolhe muitos deles em cinco capítulos da sua Parte II, relativos ao Ano Litúrgico, à devoção a Maria, ao culto dos Santos, ao sufrágio pelos defuntos e às procissões e santuários. São exemplos: pelo Natal, ar­mar o presépio, abençoar a ceia, beijar o Menino; pela Quaresma e Semana Santa, a Via-Sacra e a procissão do en­ter­ro; pela Páscoa, a visita pascal; ao longo do ano, visita ao SS. Sacramento, terço na igreja ou em família; meses do Coração de Jesus, de Maria e outros; o Angelus; consagração a Nossa Senhora; uso do escapulário, de crucifixos e me­dalhas; entronização de imagens em casa; visita ao cemitério; peregrinação a santuário, etc.

4. Con­gre­gação dos Ri­tos. Nome do dicastério da Cúria Roma­na, constituído em 1588 por Sisto V, para a liturgia e processos de canonização. Paulo VI separou os dois campos de competência, criando, para a liturgia, a Congregação do Culto Divino. Pos­teriormente (1975 e 1984) absorveu a competência da Congre­ga­ção da Dis­ciplina dos Sacramentos, cria­da por S. Pio X (1908). Finalmente, João Pau­lo II, pela reforma da Cúria (Const. Pas­tor Bonus, 1988), criou a Congregação do Culto Divino e da Dis­ciplina dos Sacramentos, à qual está confiado tudo o que respeita à liturgia.

5. Questão dos Ritos Chineses. Com este nome ficou na história uma la­mentável controvérsia entre várias corporações missio­ná­rias, originada pelo tipo de evangelização levado à corte de Pequim pelo jesuíta Ma­teus Ricci (+1610), procurando a inculturação local do Cristianismo, em ter­mos mais tarde contestados, que le­va­ram à sua condenação por Roma (séc. XVIII). Pio XI e Pio XII tomaram sobre o assunto uma posição mais compreensiva e conciliadora. Questão semelhan­te, embora com menor projecção, foi a dos Ritos Japoneses e Malabares, motivada pela aceitação por S. Francisco Xa­vier e seus primeiros companheiros da ter­mi­no­lo­gia das religiões locais para exprimir conceitos cristãos. O Conc. Vat. II, celebrado sob o signo do aggior­namento da Igreja, mostrou-se parti­cularmente interessado na *inculturação das verdades da fé e de sua celebração, convidando as Conferências Episcopais a adaptarem os r. às tradições e con­di­ções de vida dos diversos povos, para, na fidelidade à sua essência, os tornar mais compreendidos e vividos (cf. SC 1; Carta ap. Vicesimus quintus annus, 1, EDREL 3279).


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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Formação Litúrgica para o Povo de Deus



“Caríssimos irmãos e irmãs, hoje trouxemos um importante texto de Dom mauro Gagliardi sobre a necessidade da formação sobre a Santa Liturgia, logo da Missa e dos Sacramentos, para com o Povo de Deus (ML)”.
ROMA, domingo, 16 de janeiro de 2011 (ZENIT.org) - Com esta nova colaboração sobre a formação litúrgica do Povo de Deus, retomamos a coluna "Espírito da Liturgia", dirigida pelo Pe. Mauro Gagliardi.

Foi publicada, no dia 18 de outubro, a Carta aos Seminaristas, de Bento XVI, para concluir o Ano Sacerdotal. No nº 1, o Papa exorta recordando que, "quem quer tornar-se sacerdote, deve ser sobretudo um ‘homem de Deus'", e isso significa especificamente que "o sacerdote não é o administrador de uma associação qualquer, cujo número de membros se procura manter e aumentar. É o mensageiro de Deus no meio dos homens; quer conduzir a Deus, e assim fazer crescer também a verdadeira comunhão dos homens entre si. Por isso, queridos amigos, é muito importante aprenderdes a viver em permanente contacto com Deus" (nº 1).
No ensinamento do Papa Bento XVI, a oração é um "lugar" privilegiado de aprendizagem do estilo de vida cristão. Por exemplo, na encíclica Spe Salvi, o Santo Padre apresentou a oração como um dos principais "lugares" de aprendizagem e prática da esperança cristã (cf. nn. 32-34). Também na Carta aos Seminaristas, é considerada como a maneira concreta pela qual o candidato ao sacerdócio aprende a estar em íntima e contínua comunhão com o Senhor: "Quando o Senhor fala de ‘orar sempre', naturalmente não pede para estarmos continuamente a rezar por palavras, mas para conservarmos sempre o contato interior com Deus. Exercitar-se neste contato é o sentido da nossa oração. Por isso, é importante que o dia comece e acabe com a oração; que escutemos Deus na leitura da Sagrada Escritura; que Lhe digamos os nossos desejos e as nossas esperanças, as nossas alegrias e sofrimentos, os nossos erros e o nosso agradecimento por cada coisa bela e boa, e que deste modo sempre O tenhamos diante dos nossos olhos como ponto de referência da nossa vida" (nº1).
Em um trecho posterior, Bento XVI recorda que a oração, em seu estado perfeito, é o culto público da Igreja, ou seja, a sagrada liturgia e, de forma privilegiada, a Santa Missa, sobre a qual o Papa afirma: "Para uma reta Celebração Eucarística, é necessário aprendermos também a conhecer, compreender e amar a liturgia da Igreja na sua forma concreta. Na liturgia, rezamos com os fiéis de todos os séculos; passado, presente e futuro encontram-se num único grande coro de oração. A partir do meu próprio caminho, posso afirmar que é entusiasmante aprender a compreender pouco a pouco como tudo isto foi crescendo, quanta experiência de fé há na estrutura da liturgia da Missa, quantas gerações a formaram rezando" (nº 2).
A liturgia é realmente compreendida quando entramos na Tradição viva da Igreja, que recebemos como dom a ser preservado e vivido em espírito de fé e de oração. Este é, portanto, o espírito justo para celebrar e participar da liturgia. Não se trata de produzir emoções superficiais e fugazes, por meio de invenções particulares para entrar no rito, porque o verdadeiro "espírito da liturgia" é o espírito de oração adorante, de quem está "diante de Deus para servi-lo" (cf. Missal Romano [Paulo VI], "Oração Eucarística II").
O Santo Padre afirma, com base em sua experiência pessoal, que é entusiasmante aprender a compreender a liturgia com este sentido eclesial e dinâmico da verdadeira Tradição. Para isso, é necessária a formação litúrgica, que ilumina as trevas da ignorância e derruba os bastiões da ideologia, ajudando a compreender o sentido sagrado do culto divino e sua relação com toda a história da fé, que a Igreja cuida e professa em seus próprios filhos: cabeça e membros, pastor e rebanho.
A formação litúrgica não é, nem pode ser, uma forma renovada de iniciação gnóstica, um saber reservado a poucos. A formação litúrgica, embora baseada na seriedade de um estudo científico que não é para todos, deve traduzir-se de forma acessível para todos os fiéis a quem é dirigida.
Às muitas e louváveis iniciativas, no âmbito universal e local, dirigidas a cuidar da formação litúrgica do povo de Deus, acrescenta-se o nosso "Espírito da Liturgia", que abre hoje seu terceiro ano de publicação. Acolhendo muitos pedidos, decidimos experimentar, a partir deste ano, um maior corte informativo, como se notará na maior brevidade dos artigos e no número posteriormente reduzido de referências e notas. Esta escolha sacrifica, por um lado, o justo desejo dos escritores de dar mais detalhes e referências sobre as questões tratadas, mas esperamos que possa incentivar, por outro lado, uma difusão mais ampla das nossas reflexões, para chegar a um maior número de leitores. A eles se dirige, desde já, a gratidão dos autores do "Espírito da Liturgia", pela fidelidade e atenção com que nos acompanharam ao longo dos últimos dois anos e com que acreditamos que desejarão continuar a leitura.
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*O Pe. Mauro Gagliardi, doutor em teologia e filosofia, é professor de teologia dogmática no Ateneu Pontifício Regina Apostolorum, de Roma, e consultor do Ufficio delle Celebrazioni Liturgiche do Sumo Pontífice.

sábado, 15 de janeiro de 2011

O sentido do Tempo Comum




“Caríssimos irmãos e irmãs em Cristo, hoje trazemos um importante texto que nos esclarece qual o significado do Tempo Comum na Liturgia, especialmente na Santa Missa (ML)”

O Batismo do Senhor inicia o Tempus per annum ou Tempo Comum. Comum não no sentido que se trate de um tempo de escassa importância, mas entendido como o tempo em que se recorda a missão ordinária do Senhor, excluídos os grandes mistérios como a Encarnação do Filho de Deus, precedido pelo Advento, o Mistério Pascal, precedido pelo tempo forte da Quaresma. As grandes solenidades dão lugar a um estilo ao mesmo tempo vivaz e simples: é este o tempo propício para redescobrir e valorizar, em toda a sua riqueza, os tempos de Deus que se alternam no ritmo do homem. Uma eternidade que a cada ano se repropõe no seu mistério para permear e compenetrar sempre mais a vida de cada um de nós e, através de nós, de toda a história. O tempo comum exige atenção ao cotidiano, ao ciclo semanal, à vida; ajuda a entrar nos meandros de cada experiência pessoal e familiar, social e eclesial do crente. Nada pode se subtrair à graça transformadora de Cristo: afetos e dons, bens e escolhas, trabalho e festa, alegrias e fadigas, doença e morte. Tudo é marcado profundamente. A adesão ao Ressuscitado exige um percurso constante e progressivo para chegar a revestir-se de Cristo.

Este tempo é o “comum”: ocorrem tempos longos e várias mediações para acolhê-lo como regra de vida e critério de juízo, força de ação e certeza de futuro, esperança feliz.
Viver como cristão o tempo comum equivale a ser fiel à Eucaristia. Santo Inácio de Antioquia e os mártires de Abitilene diziam que sem o domingo não podiam viver.
O Domingo é o dia do encontro semanal com o Senhor ressuscitado. Dia que dá ritmo ao ano litúrgico e nos convoca com força a uma relação equilibrada entre trabalho e repouso; dia para salvaguardar em meio a todos os nossos afazeres um espaço de gratuidade para celebrar o amor de Deus que nos salva.
O tempo comum, portanto, é um período de vigilância e de esperança; daí a escolha da cor litúrgica verde.
O tempo comum é constituído por 33 ou 34 semanas subdivididas em dois períodos: o que nos conduz à Quaresma; e o que vem depois da Solenidade de Pentecostes.
Como dito, ele é “comum” na medida em que celebra o mistério de Cristo na sua globalidade, ao longo do ritmo das semanas e dos domingos.
Seremos auxiliados nisto pela leitura semicontínua de um dos evangelhos sinóticos (São Lucas em 2010) no qual encontramos a pessoa de Jesus nas suas palavras e no seu estilo de vida, os seus encontros com as pessoas, o tempo condividido com os discípulos, o ensinamento e as curas realizadas nas situações mais inesperadas.

Fonte: Pontifex
Tradução: OBLATVS




terça-feira, 11 de janeiro de 2011

A Liturgia Ferida


Por Dom Marc Aillet, bispo de Bayonne, França

“Caríssimos irmãos e irmãs em Cristo, neste belo artigo de Dom Marc, faz-se uma análise dos problemas e abusos que, normalmente, ocorrem na Liturgia e na Santa Missa (ML)”.

Discurso dado numa conferência teológica intitulada "Fidelidade de Cristo, Fidelidade do Sacerdote", de 11 a 12 de março na Pontifícia Universidade Lateranense.
Dom Marc, que estudou teologia na Universidade de Friburgo, foi professor de teologia moral no Seminário Maior de Toulon. Ele foi apontado para bispo de Bayonne em Outubro de 2008. O texto do discurso de Dom Marc apareceu em italiano e francês no site da Congregação para o Clero (www.clerus.org).

Na origem do Movimento Litúrgico, era vontade do Papa São Pio X, especialmente no motu proprio Tra le Sollecitudini (1903), restaurar a Liturgia e tornar sua riqueza mais acessível no intuito de novamente fazer dela a fonte de uma autêntica vida cristã, sublinhar o desafio de uma crescente secularização e encorajar os fieis a consagrar o mundo a Deus. Por isso, a definição de Liturgia do Concílio como "fonte e cume da vida e da missão da Igreja".
Contra todas as expectativas, como frequentemente apontado pelos Papas João Paulo II e Bento XVI, a implementação da reforma litúrgica às vezes levou a uma sistemática dessacralização, enquanto se foi permitindo que a liturgia fosse cada vez mais impregnada da cultura secularizada de todo o mundo ao redor, perdendo assim sua própria natureza e identidade: "Este mistério de Cristo a Igreja anuncia e celebra em sua liturgia, a fim de que os fiéis vivam e dêem testemunho dele no mundo" (CIC, 1068).
Sem negar os verdadeiros frutos da reforma litúrgica, pode-se dizer, todavia, que a liturgia tem sido ferida pelo que João Paulo II definiu como "práticas inaceitáveis" (Ecclesia de Eucharistia §10), e que Bento XVI denunciou como "deformações no limite do suportável" (Carta aos Bispos que acompanha o motu Proprio Summorum Pontificum). Assim também a identidade da Igreja e do sacerdote foi ferida.
Nos anos seguintes ao Concílio, nós testemunhamos um tipo de oposição dialética entre os defensores do culto litúrgico e os promotores da abertura para o mundo. Porque estes reduziram a vida cristã apenas a esforços sociais, baseados numa interpretação secular da fé, aqueles, reagindo, refugiaram-se na liturgia pura beirando o "rubricismo", com o risco de encorajar os fieis a se protegerem excessivamente do mundo.
Na Exortação Apostólica Sacramentum Caritatis, o Papa Bento XVI põe um fim a essa controvérsia e reúne essa oposição. A ação litúrgica deve reconciliar fé e vida. Precisamente como Celebração do Mistério Pascal de Cristo, verdadeiramente presente no meio do seu povo, a Liturgia dá uma forma eucarística a toda a vida cristã para torná-la "culto espiritual agradável a Deus" [§70]. Assim, o compromisso do cristão no mundo e o próprio mundo, através da Liturgia são chamados a ser consagrados a Deus.
O compromisso do cristão com a missão da Igreja e na sociedade encontra, de fato, sua fonte e seu impulso na Liturgia - trazidos para o dinamismo da oblação do amor de Cristo que aí se faz presente.
A primazia que Bento XVI deseja dar à Liturgia na vida da Igreja ("o culto litúrgico é a suprema expressão da vida presbiteral e episcopal", disse aos bispos da França reunidos em Lourdes, em 14 de setembro de 2008, numa Assembleia Plenária Extraordinária) faz voltar a adoração ao centro da vida do sacerdote e dos fieis. No lugar de um "cristianismo secular" que normalmente acompanhou a implementação da reforma da liturgia, o Papa Bento XVI deseja promover um "cristianismo teológico", o único capaz de servir ao que ele chamou de prioridade que predomina nesta fase da história, isto é, "fazer Deus presente neste mundo e dar ao povo acesso a Deus" (Carta aos Bispos da Igreja Católica, 10 de março de 2009). Onde, de fato, o sacerdote melhor aprofunda sua identidade do que na Liturgia (tão bem definida pelo autor da Carta aos Hebreus: "todo pontífice é escolhido entre os homens e constituído a favor dos homens como mediador nas coisas que dizem respeito a Deus, para oferecer dons e sacrifícios pelos pecados" (Hb 5,1))?
A abertura para o mundo à qual o Vaticano II chamou tem sido frequentemente interpretada, nos anos seguintes ao Concílio, como um tipo de "conversão à secularização". Esta atitude não careceu de generosidade, contudo, levou ao obscurecimento da importância da Liturgia, e minimizou a observância cuidadosa dos ritos, considerados distantes demais da vida do mundo, que precisa ser amado e com o que se deve estar plenamente conectado até por ele se fascinar.
O resultado foi uma grave crise de identidade do sacerdote, que não poderia mais perceber a importância da salvação das almas e a necessidade de anunciar ao mundo a novidade do Evangelho da Salvação. A Liturgia é, sem dúvida, o lugar privilegiado para se aprofundar a identidade do sacerdote, chamado a "combater a secularização", pois, como disse Jesus, em sua Oração Sacerdotal: "Não peço que os tires do mundo, mas sim que os preserves do mal. Eles não são do mundo, como também eu não sou do mundo. Santifica-os pela verdade. A tua palavra é a verdade." (Jo 17,15-17)
Isto certamente será possível através de uma mais rigorosa observância das normas litúrgicas que preservam o sacerdote da necessidade, mesmo inconsciente, de chamar para si a atenção dos fieis: o ritual litúrgico que o celebrante é chamado a receber filialmente da Igreja permite, de fato, aos fieis, chegarem mais facilmente à presença de Cristo Senhor, de quem a celebração litúrgica deve ser um sinal eloquente, e que deve sempre estar em primeiro lugar.
A liturgia é ferida quando os fieis são abandonados às arbitrariedades do celebrante, suas manias, suas ideias pessoais ou opiniões, às suas próprias feridas. Daqui também se segue a importância de não banalizar os ritos que, desprendendo-nos do mundo secular e, assim, da tentação do imanentismo, têm o dom de nos fazer mergulhar rapidamente no Mistério e nos abrir ao Transcendente.
Neste sentido, ninguém enfatizará o bastante a importância do silêncio anterior à celebração litúrgica (no nártex interior [entrada da Igreja], onde estamos livres das preocupações, mesmo legítimas, do mundo secular, a fim de entrar no tempo e no espaço sagrado onde Deus revelará seu Mistério), muito menos do silêncio na Liturgia [que leva] ao abrir-se mais prontamente à ação de Deus; e o apropriado momento de ação de graças, integrado ou não à celebração, a fim de avaliarmos a missão que nos espera, uma vez que estamos voltando para o mundo. A obediência do sacerdote às rubricas é também em si mesmo um sinal eloquente e silencioso de seu amor pela Igreja de quem ele é apenas um ministro, ou seja, um servo.
Daqui também se tira a importância da formação, dos futuros sacerdotes, em liturgia e especialmente em participação interior, sem a qual a participação exterior defendida pela reforma seria sem alma e se favoreceria uma compreensão parcial da liturgia que acabaria por se expressar em termos de uma excessiva teatralização dos papeis, "cerebralização" redutiva dos ritos e abusiva auto-celebração da assembleia.
Se a participação ativa, que é o princípio operacional da reforma litúrgica, não é o exercício do "senso sobrenatural da fé", a liturgia não é mais obra de Cristo e sim obra dos homens.
Insistindo na importância da formação litúrgica dos sacerdotes, o Concílio Vaticano II fez da Liturgia uma das principais disciplinas dos estudos eclesiásticos, evitando reduzi-la a uma mera formação intelectual: de fato, antes de ser um objeto de estudo, a liturgia é vivência, ou melhor, é "transcender a própria vida para imergir na vida de Cristo". É a imersão por excelência de toda a vida cristã: imersão no senso da fé e no senso da Igreja, em louvor, adoração e missão.
Somos, pois, chamados a um verdadeiro "Sursum corda". A frase do prefácio, "corações ao alto", introduz os fieis ao coração dos corações da liturgia: a Páscoa de Cristo, isto é, sua passagem deste mundo para o Pai. O encontro de Jesus ressuscitado com Maria Madalena na manhã da Ressureição é muito significativo neste sentido: com o seu "Noli me tangere" [Não me toques], Jesus convida Maria Madalena a "olhar as realidades do alto", fazendo-a perceber em seu coração que ele ainda não subiu para o Pai e pedindo-lhe para contar aos discípulos que ele deve ir para seu Deus e nosso Deus, seu Pai e nosso Pai.
A liturgia é precisamente o lugar desta elevação, este estender-se no rumo do Deus que dá à vida um novo horizonte e, enfim, sua orientação definitiva, desde que não consideremos isso como material disponível para nossas manipulações antropocêntricas ("tudo para o homem"), mas que observemos, com filial obediência, as prescrições da Santa Igreja.
Como o Papa Bento XVI disse na conclusão de sua homilia na Solenidade de São Pedro e São Paulo [29 de Junho de 2008]: "Quando o mundo inteiro se tornar uma liturgia de Deus; quando, em sua realidade, ele se tornar adoração, então ele terá chegado à sua meta e estará são e salvo".